segunda-feira, 18 de março de 2013

O Orgulho Da Cidade, Urbanismo e invenção da beleza


Continuando com a comparação da cidade medieval com a cidade contemporânea, se faz uma pergunta. Em que sentido a cidade é sinônimo de sociabilidade?(embora, tenha se tornado hoje sinônimo de individualismo e de anonimato) Le Goff nos mostra que na Idade Média existia uma “separação” da cidade, dita civilizada e em ordem, do campo, colocado como local de rusticidade. E com essa ideia de cidade, surgiu um desejo de construção em direção ao céu, partindo disso, o livro nos mostra uma comparação de obras arquitetônicas de épocas diferentes, mas que em ambas nota-se, uma verticalidade bem definida, as torres medievais de San Gimignano na Itália, com a verticalidade da cidade atual de Manhattan.

Com tantas peculiaridades, a Idade Media desenvolveu uma beleza artística urbana própria, que deu origem ao que podemos denominar novo urbanismo, entretanto essa cidade medieval possuía outro lado.

Começou a se criticar (principalmente os religiosos) a cidade que diferente da cidade atual, não se preocupava com a sua conservação, porém, existia uma espécie de orgulho urbano que os moradores dessas cidades desenvolveram a partir de uma sobreposição do que se tinha como cidade ideal (sonhada e imposta pelos detentores do poder) e a cidade real.
Nessa época, ocorria uma super Valorização das terras e dos imóveis que ficavam “protegidos” pelas muralhas, e essa ideia de cidade sonhada, trouxe consigo uma visão da cidade como lugar de beleza e prazer, onde seus habitantes cada vez mais exaltam as qualidades dessa dita cidade.

No livro mostra um exemplo dessa forma de visão, uma carta da Universidade de Toulouse com a intenção de mostrar o que seria atrativo na cidade paras as pessoas que ali viviam que a cidade tinha um ar mais puro, que existia uma preocupação com a higiene, que tinha água em abundância, mercados sempre abastecidos e mulheres boas e calmas, ou seja, em resumo a ideia deles era que Toulouse era uma cidade ótima de se viver, oferecendo diversão, um local de sociabilidade.

“É a sociabilidade, o prazer de estar com o outro, que estabelece em definitivo, a diferença urbana, a urbanidade”.

Se analisarmos as sociedades mais antigas, como por exemplo, Roma, nota-se que desde esta época criou-se, do ponto de vista cultural, um contraste acentuado entre cidade e o campo, e a partir disso, surgiu os termos que referem-se à cidade como lugar de educação, cultura, elegância e dos “bons costumes” .

A palavra urbanidade vem do latim: urbs polis, da polis grega.

Essa visão de menosprezo pelo o que é do campo, colocando-o como lugar bárbaro, rustico reforçando de forma ativa a ideia de que os camponeses seriam rudes e até mesmo pessoas ricas, como os senhores feudais, que preferissem o campo á cidade são ditos bárbaros, tudo isso denota traços de uma herança de povos antigos de origem latina. Em meio a isso surge mais uma variável de oposição cidade-campo, a floresta, que seria pensado como um lugar mais selvagem e hostil que o campo, pois apesar de tudo, o Campo ao menos era habitado, existe de certa forma uma visão, que o campo seria o reflexo da cidade, já que a mesma domina o campo (economicamente) já pensando na floresta essa relação não existe, posto como um lugar irredutível, local de bandidos e sinônimo de solidão.

Le Goff nos mostra que é perceptível também que, o cristianismo na Idade Média era bastante instável, variando sua visão da cidade entre ser um polo de radicalidade solidária entre um polo de civilização, pois nota-se que por anos a operação mais inovadora das tais cidades, seria sua função cultural, que engloba escolas, as artes, o urbanismo. Como é posto no livro: “...é na cidade e da cidade que eles irradiam.” Deixando claro que a cidade adotou essa função cultural  desde do tempo Medieval até os dias atuais, mesmo que atualmente se tenha uma certa competição para se ter essa responsabilidade, entre as cidades e os lugares extra urbanos.

A próxima pergunta apresentada a Le Goff, seria como a pintura nessa época era representada, visto que tudo era controlado por ordens mendicantes, o mesmo responde que  a representação das pinturas se dava pelo o imaginário do artista, como era de costume, representando os diversos lugares e afins de forma positiva.

Mostrou-nos esse quadro do pintor Ambrosio Lorenzetti de 1346, o qual simboliza a cidade ideal, imaginada pelo povo da época, esse quadro é considerado a primeira representação de uma paisagem urbana. Percebemos nesse quadro que o pintor cria uma cidade com uma estrutura com predominância de linhas retas e planos geométricos, com características arquitetônicas do estilo gótico, estilo este que ficou conhecido como a arte das catedrais retratando o desenvolvimento das cidades.


Percebemos então que, nas cidades atuais, perpetuamos poucos traços das cidades medievais, de forma direta, mas herdamos a ideia de veduta, ou seja, o panorama urbano, cada coisa possui não apenas uma representação, mas também vistas de uma mesma cidade.

Quando perguntado sobre se trata-se de uma dificuldade em dominar a perspectiva, o fato da imagem que a Idade Média  dá de suas cidades, serem normalmente estendidas para o alto, Le Goff diz que não pretende construir uma historia preconceituosa em relação as sensibilidades, mas sim recordar do orgulho urbano Medieval contido nessa necessidade de subir, principalmente as catedrais, mostrando desta forma seu domínio sobre a cidade, expressado não apenas de forma física mas também de forma cultural e econômica na cidade.

O autor complementa dizendo na antiguidade a orientação fundamental do espaço, se dava por dois lados (direito e esquerdo) e que sendo considerado o lado direito mais correto e representado, e que na Idade Média, esse eixo de representação fundamental de orientação se dá de baixo para cima, enfatizando cada vez mais a ideia de chegar a Deus não apenas por meio da fé, mas também com construções cada vez mais altas.

A sonhada cidade medieval ideal, vista como imagem, da forma real que a vemos, de modo prioritário na pintura, seria a cidade atual de Manhathan.

Esse ideal de cidade trás consigo uma necessidade que as famílias ricas da época desenvolveram principalmente nas cidades onda a nobreza estava, que seria possuir a torre mais alta do que as dos outros, sendo esse fato status de poder, assim como ocorre nas cidades atuais como Manhathan, realizando deste modo uma forma das mais poderosas da imaginação medieval: a verticalidade.

A cidade Medieval cresceu em altura, mas também, existiam construções subterrâneas como no caso de Paris que era construída sobre a exploração e a escavação de jazidas. Logo no começo do século XIV, as pessoas mais ricas eram os detentores dessas jazidas e pedreiras subterrâneas.

Vale salientar que, esses subterrâneos tinham usos variados, não apenas do tipo troglodita, sendo construídas nesses locais até capelas.

Existia uma ambiguidade em certos conceitos difundidos nas cidades Medievais, depois da associação das alturas das construções com a sua proximidade com Deus, percebe-se também que, a cidade pode ser um lugar que agrade também ao demônio.

O livro nos trás posteriormente que a cidade pode ser comparada com Sodoma e Gomorra.

Para o povo do medieval, sua imaginação urbana percorria a imagem de Jerusalém, a dita cidade “boa”, e pela Babilônia, a cidade “má”.

Le Goff diz que a ideia de que os camponeses pudessem se revoltar contra a ordem da cidade não se encaixa, porque nessa época não se media a exploração econômica da cidade sobre o campo, pois quando camponeses revoltosos, por motivos rotineiros ou não, queriam mudar algo, falavam diretamente com o burguês “progressista” e resolviam seus impasses antes mesmo que tal problema chegasse aos ouvidos dos demais, e interferisse na ordem e no modo de organização das cidades.

Quando se é perguntado se a critica da cidade apenas era feita de cunho “espiritual”, Le Goff comenta que essas criticas eram feitas sim com caráter religioso. A igreja via a cidade como algo profano que consumia as virtudes espirituais principalmente dos representantes da igreja como, por exemplo, São Martinho que frequentava periodicamente o monastério afastado da cidade para “repor as energias”. Essa forma de visão era bem difundida pela elite Medieval.
Quando perguntado sobre quando se formou a ideia de percepção da cidade como algo que deveria ser preservado, como testemunha da harmonia e que deveria ser conservado, Le Goff nos mostra que a mentalidade do medieval era diferente do que temos hoje sobre patrimônio, lá não se via a demolição de algo como punição, mas sim como uma mudança, aliás, a cidade medieval vivia sendo alterada, dita lugar de renovação, colocado como otimismo dinâmico urbano, “... a cidade é um lugar em que mais se constrói, do que se conserva ou se destrói”. Isso se deve ao fato que as pessoas dessa época não estarem tão apegadas na aparência das cidades, porque eles viviam em constante mudança. A renovação das cidades era diretamente ligada na renovação da população urbana.

Essa ideia de preservação do patrimônio histórico se deu muito depois, essa inquietação sobre o futuro e sobre o que é ou não importante para ser conservado, é uma invenção da modernidade


FONTES: GOFF, Le Jacques. Por amor às cidades. São Paulo: Unesp, 1998.

A formação do prodessor de história: idade média e imagens. Disponível em: http://www.ppe.uem.br/jeam/anais/2008/pdf/c010.pdf

por: Maria Rita Abreu

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